Sem pretender fazer uma retrospectiva dos acontecimentos, recordo apenas que se discutiu largamente a distância enorme ao centro da capital, as inadequadas condições geológicas do local, a ausência de sustentável tecido urbano envolvente e, muito mais discretamente, a repercussão negativa que um aeroporto situado a 60 km a norte da capital poderia ter na intensidade de utilização do segundo maior aeroporto nacional, o Francisco Sá Carneiro, que serve o Porto e a região Norte. Contudo, o jogo já estava, nesse momento, completamente viciado, perante o facto de que a discussão gira em torno do local onde se construirá e ultrapassa a questão da real necessidade de construção de um novo aeroporto. Como se pode afirmar tão peremptoriamente que a Portela não sustentará por muito mais anos o previsível fluxo de passageiros? Já alguém por ventura reparou na má distribuição, ao longo do dia, dos horários dos vôos que chegam e partem de Lisboa? Já alguém deu conta que os balcões de check-in na Portela com números do 70 ao 90 estão quase sempre vazios? Já alguém parou para pensar que o País tem um Sá Carneiro subutilizado, com belíssimas condições, que não dista mais de 200 km de Leiria, 150 km de Coimbra, 90 km de Aveiro, etc..? Já alguém se deu ao trabalho de quantificar os passageiros que acabam por partir e/ou chegar ao Porto (e os que, não fazendo, poderiam fazê-lo de bom grado ou sem grandes problemas) e não o fazem directamente de Sá Carneiro desde logo por não haver vôos directos, acabando muitas vezes por perfazer viagens de automóvel ou comboio para norte? Será efectivamente tão difícil e custoso fazer obras de adaptação na Portela, pois quem lá aterra ou de lá descola, lá circula ou passa de carro, não vê propriamente um conjunto de empreendimentos em seu redor indiciadores da impossibilidade de resgate dos respectivos terrenos? Será que efectivamente não existem potentes interesses imobiliários em Lisboa e do sector da construção (para Lisboa e Ota) que possam estar a empurrar a vontade de decidir pró-Ota ou até pró-Alcochete? Será até tão facilmente calculável assim o fluxo de vôos no futuro, num mundo que ainda não conseguiu lidar efectivamente com fenómenos como o terrorismo ou dominar sérias ameaças à economia global?
Parece-me claro que, havendo razões inequívocas para a efectiva necessidade de construção, elas não foram nunca suficientemente comprovadas. Parecem mesmo muito mais lacónicas as alusões a essa necessidade de construção do que as evidências de que a Portela possa comportar a evolução do fluxo aéreo nas próximas décadas.
Por tudo isto, não parece, antes de mais, desprovido de qualquer sentido a simples hipótese “Portela+0”.
Por outro lado, e tendo em conta que já são públicos diversos estudos alternativos que apontam outras localizações e soluções, pretendia revelar, em primeira mão no OPJ, um importante estudo de que fiz parte, enquanto cidadão, e que reuniu outros beneméritos voluntariosos individuais, enviado em devido tempo ao governo – a hipótese de o novo aeroporto de Lisboa se situar em São João da Pesqueira. Por pudor e necessidade de concisão, revelo apenas alguns dos argumentos favoráveis conclusivos, do ponto de vista técnico, político e económico-turístico: - vastas áreas de terreno desprovidas de acidentes geográficos; solo bastante mais propício e com pequena quantidade de bacias hídricas comparativamente com Ota e Alcochete; pista natural para hidroaviões (no rio Douro, mesmo ao lado); fomento do emprego numa das regiões nacionais mais carenciadas nele próprio e menos evoluídas economicamente; atracção de enorme fluxo de passageiros espanhóis, designadamente de Castilla, León e Extremadura, que não possuem aeroportos condignos; aproveitamento de clientes/passageiros provenientes de todos os pontos cardeais envolventes, ao contrário da Ota, Alcochete ou os próprios Sá Carneiro e Portela, que nunca conseguirão atrair passageiros a Oeste; potenciação da exploração turística de diversos ex-líbris nacionais pouco explorados como as gravuras de Foz-Côa, o museu de Santa Comba Dão, o Palácio de Mateus, os rebuçados da Régua e o presunto de Lamego; inexistência da necessidade de construção de nova ponte sobre o Tejo, como em Alcochete; ausência do risco de que nenhuma terra próxima assustasse os passageiros com o seu próprio nome, também como no caso de Alcochete. Ou não faltará gente que recuse voar a partir de Alcochete sabendo que, assim que se descola, logo se sobrevoa uma área chamada Sarilhos Grandes?