De há alguns anos a esta parte, perante a profissional crescente pressão de continuar a gerar apelativas notícias durante um período em que pouco se vai passando no País, para além de enebriantes banhos de sol e de dolorosas imagens de flora nacional em chamas, generalizou-se a adopção dessa notável expressão importada – silly season. Bastante menos usada na imprensa das nações anglo-saxónicas, de onde é proveniente, até porque aí existe a saudável prática das curtas férias fraccionadas, a silly season acaba por desencadear, ela própria, belas manchetes dos nossos mass media. Pode parecer uma tontaria, mas revela-se subtil e profundamente eficaz: por um lado, desculpa a provável escassez de factos mais interessantes; por outro lado, constitui-se ela mesmo um dos melhores conteúdos noticiosos possíveis.
Mas, para que possa existir, na realidade, uma silly season, deveria esta ser precedida por uma época que não tivesse sido propriamente tonta. Ora, no caso actual do nosso País, este facto poderá eventualmente ser posto em causa, pela quantidade e qualidade de factos e de não-factos ocorridos em vários “sectores-chave” da nossa sociedade, desde Setembro do ano passado.
Na área da Justiça, as tão propagadas “machadadas” na ineficácia do sistema resumiram-se praticamente a estéreis discussões sobre a pertinência na redução das férias judiciais, e que, provavelmente, nunca serão esclarecidas, até porque os próprios envolvidos tudo farão para provar que a mudança é negativa. De resto, casos como o da Casa Pia e outros grandes processos estagnam ou regridem.
Com as famosas listas de espera à cabeça, os presumivelmente graves problemas na Saúde permanecem inalterados e sem perspectivas de evolução, dominados por “corajosas” medidas como a da banalização da venda de medicamentos, que os tornaria mais acessíveis aos utentes, mas que, afinal, parecem resultar em mais aumentos do que reduções dos preços de compra. Embora sem se perceber o impacto das alterações nos modelos de gestão hospitalar, as novas políticas de comparticipação no custo dos fármacos, a racionalização de serviços e os encerramentos de blocos e unidades hospitalares têm, pelo menos, o condão de indiciar que o custo estatal com a Saúde poderá ser desacelerado. A meio de tudo isto, viemos a ser surpreendidos por um sério estudo internacional que apontava o sistema de saúde nacional como bem cotado no ranking europeu, o que, no mínimo, nos faz interrogar sobre se a Saúde será afinal um problema nacional, e, por conseguinte, tão reformável assim.
Por outro lado, durante esta smart season, surgiu finalmente à superfície aquilo que todos já sabiam sobre a Segurança Social: que ela estará brevemente falida. Das múltiplas medidas rapidamente anunciadas para o evitar, não sabemos realmente quantas serão entretanto corrigidas (como a recentemente anunciada redução da penalização por reforma antecipada), quais não serão efectivamente postas em prática e se as adoptadas conseguirão desviá-la eficientemente do destino da ruptura.
A continuação do afundamento do nosso sector primário por nada de novo ter sucedido, os amuos do ministro e as zangas dos agricultores foram os factos mais relevantes na Agricultura durante este longo período entre férias.
Já na política externa, a agenda foi quase totalmente dominada por um outro ministro errante, cansado, doente e substituído.
E houve, enfim, toda uma interminável sucessão de pomposas não-notícias sobre a suprema questão do défice orçamental – do défice enganado ao défice real, do défice expectável ao défice possível, do défice desejável ao défice temido. De todo um conjunto de anúncios e medidas para uma brutal diminuição da despesa pública, com grãos e tropeços pelo meio como os da Ota e do TGV, encontramo-nos realmente com as mesmas exactas preocupações do ano passado, desconhecendo como poderá estar o défice em 2007, 2008 e até em 2006.
Por tudo isso, não será totalmente tonto admitir que, em tantas importantes áreas do nosso funcionamento como País, desde que este regressou das férias de 2006, poucos factos importantes se passaram e tantos factos se passaram que não são realmente importantes.
Não será assim mesmo que se define uma silly season?
Mas, bom, lá vamos nós novamente de férias, porque pelo menos este País nos beneficia com óptimos princípios de direitos adquiridos, muito mais do que com regalias obtidas por méritos efectivos. Um dia, talvez, consigamos ter a lucidez de nos interrogar sobre se valerá a pena nos darmos todos ao luxo de, durante tanto tempo, pararmos o País para férias, quando temos realmente que fazer muito mais e melhor.
Até lá, aproveitamos uns bons banhos de sol, as imagens das florestas em chamas e as notícias da silly season.
Mas, para que possa existir, na realidade, uma silly season, deveria esta ser precedida por uma época que não tivesse sido propriamente tonta. Ora, no caso actual do nosso País, este facto poderá eventualmente ser posto em causa, pela quantidade e qualidade de factos e de não-factos ocorridos em vários “sectores-chave” da nossa sociedade, desde Setembro do ano passado.
Na área da Justiça, as tão propagadas “machadadas” na ineficácia do sistema resumiram-se praticamente a estéreis discussões sobre a pertinência na redução das férias judiciais, e que, provavelmente, nunca serão esclarecidas, até porque os próprios envolvidos tudo farão para provar que a mudança é negativa. De resto, casos como o da Casa Pia e outros grandes processos estagnam ou regridem.
Com as famosas listas de espera à cabeça, os presumivelmente graves problemas na Saúde permanecem inalterados e sem perspectivas de evolução, dominados por “corajosas” medidas como a da banalização da venda de medicamentos, que os tornaria mais acessíveis aos utentes, mas que, afinal, parecem resultar em mais aumentos do que reduções dos preços de compra. Embora sem se perceber o impacto das alterações nos modelos de gestão hospitalar, as novas políticas de comparticipação no custo dos fármacos, a racionalização de serviços e os encerramentos de blocos e unidades hospitalares têm, pelo menos, o condão de indiciar que o custo estatal com a Saúde poderá ser desacelerado. A meio de tudo isto, viemos a ser surpreendidos por um sério estudo internacional que apontava o sistema de saúde nacional como bem cotado no ranking europeu, o que, no mínimo, nos faz interrogar sobre se a Saúde será afinal um problema nacional, e, por conseguinte, tão reformável assim.
Por outro lado, durante esta smart season, surgiu finalmente à superfície aquilo que todos já sabiam sobre a Segurança Social: que ela estará brevemente falida. Das múltiplas medidas rapidamente anunciadas para o evitar, não sabemos realmente quantas serão entretanto corrigidas (como a recentemente anunciada redução da penalização por reforma antecipada), quais não serão efectivamente postas em prática e se as adoptadas conseguirão desviá-la eficientemente do destino da ruptura.
A continuação do afundamento do nosso sector primário por nada de novo ter sucedido, os amuos do ministro e as zangas dos agricultores foram os factos mais relevantes na Agricultura durante este longo período entre férias.
Já na política externa, a agenda foi quase totalmente dominada por um outro ministro errante, cansado, doente e substituído.
E houve, enfim, toda uma interminável sucessão de pomposas não-notícias sobre a suprema questão do défice orçamental – do défice enganado ao défice real, do défice expectável ao défice possível, do défice desejável ao défice temido. De todo um conjunto de anúncios e medidas para uma brutal diminuição da despesa pública, com grãos e tropeços pelo meio como os da Ota e do TGV, encontramo-nos realmente com as mesmas exactas preocupações do ano passado, desconhecendo como poderá estar o défice em 2007, 2008 e até em 2006.
Por tudo isso, não será totalmente tonto admitir que, em tantas importantes áreas do nosso funcionamento como País, desde que este regressou das férias de 2006, poucos factos importantes se passaram e tantos factos se passaram que não são realmente importantes.
Não será assim mesmo que se define uma silly season?
Mas, bom, lá vamos nós novamente de férias, porque pelo menos este País nos beneficia com óptimos princípios de direitos adquiridos, muito mais do que com regalias obtidas por méritos efectivos. Um dia, talvez, consigamos ter a lucidez de nos interrogar sobre se valerá a pena nos darmos todos ao luxo de, durante tanto tempo, pararmos o País para férias, quando temos realmente que fazer muito mais e melhor.
Até lá, aproveitamos uns bons banhos de sol, as imagens das florestas em chamas e as notícias da silly season.