sábado, 6 de janeiro de 2007

Porque Não

Convenhamos que há diversas razões respeitáveis do lado do "Sim" e do lado do "Não", e que nenhuma das duas soluções é obviamente perfeita.

Más razões ou não-razões para o "Sim", há muitas. Boas razões há 2:
1- Haverá sempre abortos provocados, por isso que se dêm boas condições para a sua realização
2- Existem gravidezes indesejadas que, se forem levadas até ao fim, para além de causarem fortes transtornos sociais, profisisionais ou económicos às mães, podem não permitir que a criança se desenvolva em boas condições sociais e económicas

Para o "Não", também há várias más razões e não-razões. Mas boas razões, encontrei 32:
1- Porque não se pode restringir a propriedade de um embrião a quem o gera, ele é sobretudo dele próprio, do País e do mundo também
2- Porque não é bonito resolvermos as dificuldades matando algo ou alguém
3- Porque não existe magia maior do que um ser humano em gestação
4- Porque não se pode negar a um ser tão vulnerável a única protecção que o País lhe pode actualmente dar
5- Porque não temos outro remédio na vida, senão assumirmos os contratempos e arcarmos com os nossos erros, sobretudo quando estão em causa altos valores
6- Porque não é razoável que o Estado financie abortos em vez de trabalhar em políticas sociais que melhor apoiem quem mais precise para fazer crescer uma criança
7- Porque não é correcto que o Estado se demita de ajudar um bebé não nascido até à sua idade adulta, quando o faz com um bebé vivo abandonado num local público
8- Porque não é legítimo considerar que a vida pode ser destruída, por qualquer razão, com 10 semanas, e não se já tiver 11, 12 ou 15
9- Porque não é definitivamente a mesma coisa o uso de métodos contraceptivos, para evitar o aparecimento de uma vida, ou acabar com ela


10- Porque não está proibido, na actual lei, que se realize o aborto provocado quando está em causa a saúde da mãe, uma má-formação do embrião ou uma gravidez por violação
11- Porque não é a actual lei do aborto um verdadeiro problema nacional, mas sim o nível de vida de muitos portugueses
12- Porque não existe nenhum estudo que aponte claramente que percentagem de casos lidam com condições sócio-económicas realmente impróprias e, por outro lado, quantas são as intenções de aborto motivadas por simples constrangimento sociais ou de progressão profissional
13- Porque não se iria permitir, pela lei proposta, o direito do pai se responsabilizar pela criança após nascer
14- Porque não está sequer consagrada, nessa nova lei, a possibilidade de a criança ser acolhida por uma outra família, uma igreja ou uma instituição social pública ou privada
15- Porque não faz falta em Portugal nenhum tipo de incentivo à redução natalidade, estando o País a envelhecer
16- Porque não está ainda tudo feito em matéria de informação preventiva, de planeamento familiar, de educação sexual no ensino e de fomento de uma cultura de solidariedade na sociedade
17- Porque não há actualmente nenhuma portuguesa que não possa tomar a pílula abortiva, do "dia seguinte"
18- Porque não existe quem possa garantir que a mudança da lei não resulte num brutal aumento dos abortos em Portugal, à semelhança do sucedido noutros países ou pior ainda
19- Porque não ficará o País fica mais moderno e próspero por ter uma lei do aborto mais liberal e europeia
20- Porque não faltam lugares no mundo em que vigora a liberalização e onde já se discute se a lei deve voltar a proibir o aborto forçado, como em Inglaterra ou na Alemanha, ou até já se referenda o regresso à lei antiga, como em certos estados americanos

21- Porque não faz nenhum sentido repetir o mesmo referendo passados 8 anos, só porque o Não ganhou por poucos votos e o País estar numa “maré de esquerda”
22- Porque não é o julgamento de mulheres a questão central do referendo, bastando o Parlamento pretender descriminalizar as abortadoras, para resolver esse detalhe
23- Porque não há uma única mulher condenada por aborto, muito poucas foram julgadas e as que foram tinham gravidezes bem mais evoluídas do que 10 semanas
24- Porque não é mais falacioso pensar que se pode ir abortar a Espanha do que decidir mudar a lei só porque haverá sempre quem a viole
25- Porque não há garantia para ninguém de que o trauma causado por um aborto não seja maior do que ajudar a dar um destino de vida a uma criança que não era desejada à partida
26- Porque não sabemos nunca se o português que estamos a permitir matar não poderá ser amanhã um compatriota de quem todos nos possamos orgulhar, útil ao País ou que simplemente faça a felicidade de outros e a dele próprio
27- Porque não conseguimos nunca analisar as coisas tão claramente “a quente” e haverá sempre um sério risco de simplesmente nos arrependermos de algo grave que não podemos corrigir
28- Porque não há muitos sacrifícios feitos por fortes causas que a vida que não nos retribua de algum modo
29- Porque não devemos fazer aos outros aquilo que não gostaríamos que nos fizessem a nós (catolicismo à parte)
30- Porque não é sério perguntar aos portugueses “concorda com a despenalização da interrupção voluntária da gravidez…?” quando está efectivamente em causa “concorda com o fim de uma gravidez por qualquer motivo…?”


31- Porque não é correcto que o Estado induza na sociedade uma “cultura laxista" ou uma "cultura de morte”, sobretudo quando tem consciência de que não pode accionar outras vias eficazes de as minimizar, demitindo-se de fazer mais para proteger um cidadão em potencial, só porque entende que essa sua protecção pode ser desrespeitada por alguns e por haver dificuldades em puni-los.
32- Porque não há dúvida de que, na dúvida, se devem deixar as coisas estar como estão

9 comentários:

Anónimo disse...

Brilhante!
As razões para Nao são bem mais do que para Sim.
E a maior de todas é "Não se pode matar". E já devia chegar

Anónimo disse...

Nunca tinha visto que há tantas razões para votar Não, embora algumas se repitam um pouco. As 2 apontadas para o sim, são fortes, mas o não ganha para mim. EU VOTO NAO

Pe.T.C. disse...

Muito bem. Gente que pensa com o coração... é bom encontrar gente desta na internet.

Anónimo disse...

Realmente exaustivo e profundo. Há que divulgar a mensagem

Anónimo disse...

Fazem falta documentos assim: lúcidos e equilibrados, mas acertivos e convictos!
Que haja elevação no debate que temos pela frente. O assunto é demasiado sério para ser levado com argumentos ligeiros e demagogias políticas..

Anónimo disse...

A razão poderia ser até só uma: não se mata nada nem ninguém seja porque motivo for, muito menos porque não dá jeito ou as complicações são bastantes!

Anónimo disse...

Mas admitamos que uma mulher aborte com 12 ou 13 semanas, ela deverá ir para a cadeia?

M disse...

A única razão que ainda me leva a considerar que uma mulher deve poder abortar dum embrião é naqueles casos em que o método contraceptivo falhou. Em parte porque por embrião entendo um ser humano que ainda não tem forma humana. E além disso porque tal como acontece na violação essa será uma gravidez que acontece contra a vontade da mulher, que tomou todas as precauções para que ela não acontecesse. Não foi ela que falhou, foi o método contraceptivo, logo não é justo obrigá-la a passar por uma gravidez indesejada.

Só não sei como se garantiria que apenas embriões seriam abortados e que só mulheres que usam anticoncepcionais seriam contempladas. Pelo que ouço dizer, nos países em que o aborto é livre os limites impostos por lei são na práctica constantemente desrespeitados por aqueles a quem o crime aproveita.

Como este referendo não faz distinções entre embriões e fetos, entre pessoas responsáveis e as que não o são; e como o estado Português não me oferece quaisquer garantias de conseguir fazer respeitar qualquer lei, penso que vou votar não.

AndRocPinho disse...

Cara Mariana, (estou a comentar o teu post, deixado no meu blog faroldodeserto.blogspot.com, lá, e em dois blogs teus – desculpa o imediato tratamento por “tu”).
A futura lei, se passar no referendo, não vai ser selectiva relativamente às razões dos pedidos de aborto. Quem quiser, aborta, não justifica e pode ficar a cobro do anonimato. De qualquer forma, seria muito difícil de aplicar um esquema de selectividade em função dos motivos e dos possíveis cenários de crescimento do bebé, após nascer. Daí que eu defendo que a mãe deveria ter o direito de não querer ter a criança, mas, nesse cãs,o deveria ter que entregá-la ao Estado depois de nascer, (que a levaria para um casal que quisesse adoptá-la ou para uma instituição), tal como faria se a mãe o abandonasse à nascença num hospital.
Ao votar “sim”, resolvemos os problemas de quem não tem grandes meios económicos (e dos que também não se estão para chatear com arranjá-los…) e lavamos as mãos do estado, a quem custa muito menos mandar um embrião para o caixote do lixo, do que educá-lo até à vida adulta.
Acredito que a maioria das gravidezes indesejadas seja motivada por falhas contraceptivas, mas também acredito que, em quase todas elas, poderia ter havido maior cautela na sua utilização. O sexo deve ser um veículo libertador, um direito e um prazer de qualquer cidadão livre e maduro, mas não pode deixar de ser um acto de responsabilidade. E quando está em causa uma vida ou uma forma de vida… há que ter respeito. Induzir na sociedade que o aborto funciona como um contraceptivo de recurso, à posteriori, é uma crueldade leviana para a espécie humana. E agora, até há a pílula “do dia seguinte”, que não havia no último referendo.
Há 8 anos, eu votei “sim”. Agora, temo ser “derrotado” de novo, pois mudei de opinião e vou votar “não”.
Ser prático é votar “sim”. Pensando bem, admito que com algum pragmatismo, podemos achar que não é possível reduzir drasticamente o número de gravidezes indesejadas, e então resolve-se a questão assim, sobretudo dos mais carenciados que se veriam em aflição com uma criança nos braços, mas o injusto é que resolvemos o problema do Estado, que nunca mais se incomoda com o assunto.
Pensando mais ainda, ser mais pragmático ainda é votar “não”. Porque assim obrigará o Estado a investir conveniente e finalmente em informação, formação, planeamento familiar. Com uma maioria de esquerda, derrotada, isso teria inevitavelmente que acontecer. E mais, encarar-se-ia de imediato a descriminalização das mulheres (não dos médicos e de outros intervenientes). Talvez quem sabe, até obrigaria o Estado a pensar se não encontrará sistema para se responsabilizar pela educação das crianças indesejadas por parte dos que realmente não tenham como oferecer meios minimamente dignos para a evolução do novo ser. Utópico, dirão alguns a esta última parte. Realizável, diria eu, desde que os decisores consigam mobilizar o verdadeiro espírito humanista português, que ainda temos. Haja vontade. Pelo menos, é esse o País que eu quero. Humanista, em todos os aspectos. Para com os que não podem MESMO, para com os que POR CERTO querem viver.

Mariana, só duas pequenas “achegas”: embrião é a forma de vida até aos 3 meses, feto a partir daí. A lei proposta admite abortos livres até aos 2,5 meses, que é mesmo que 10 semanas. Por isso, só seria válida para embriões. Mas, hás 7/8 semanas, o embrião já tem todos os órgãos externos formados. Com 10 semanas, já tem todos os órgãos externos e internos. E pergunto eu, quem se decidir abortar com 11, 12 ou mais semanas? Serão assim tão poucos casos? Não vão ter os mesmos exactos problemas? Não vão manter vivo o aborto clandestino que tantos querem abolir?