sábado, 29 de março de 2008

A SETE CHAVES


A crescente natalidade de movimentos de cidadãos que se pretendem identificar com a tão banalmente chamada “sociedade civil” deve ser objecto de reflexão por parte da própria “sociedade civil”, por parte dos órgãos do regime instituído, por parte dos partidos políticos.
O mais recente exemplo foi protagonizado pelo “Novo Portugal”, grupo de reflexão (ainda sem qualquer tipo de classificação, seja ele de Associação, Movimento, Plataforma, etc.,) constituído por cidadãos que de algum modo se destacaram em um dos mais diversos quadrantes profissionais, todos eles com menos de 45 anos. Assim, o evento “Novo Portugal – Opções de uma Geração” reuniu cerca de 120 gestores, empresários, médicos, professores, advogados, cientistas, investigadores, marketeers, economistas e profissionais oriundos de áreas tão vastas como a arte, a tecnologia, as letras e as humanidades, no intuito de produzirem um documento que não apenas pretende desafiar o País a discutir o diagnóstico a ele feito, como também a equacionar o seguimento de linhas de orientação propostas, para um degrau de tempo de cerca de 25 anos, ou seja, o período aproximadamente correspondente a uma geração.
Note-se desde logo que o “Novo Portugal” mostrou-se tão abrangente em termos de matérias abordadas, quanto são razoavelmente despretensiosos os seus propósitos. Abrangente uma vez que não reúne apenas empresários e/ou gestores, mas profissionais especialistas em múltiplos sectores da vida económica, social, cultural e “política”. (As aspas devem-se ao sentido eminentemente não partidário do termo.) De objectivos despretensiosos porque, apesar de o documento ser levado à Presidência da República e de pretender ter a sociedade como interlocutora, este grupo não se constitui com o objectivo de bem se posicionar para conquistar papéis de relevo na sociedade, dado que a maioria dos seus elementos já se encontram na “linha da frente” a esse respeito. Aliás, a plena legitimidade do “Novo Portugal” para interferir nas grandes questões nacionais não advém apenas daí, mas também do facto de, sendo constituído por jovens até 45 anos, fazer parte de uma geração que não tem responsabilidades nas grandes marcas político-sociais da nossa história passada ou recente, sejam elas o estabelecimento e manutenção do Estado Novo ou a Revolução de 25 de Abril, o processo de descolonização, a actual Constituição da República, o compromisso europeu ou a criação da actual lógica político-partidária democrática. Sem qualquer mérito, mas também sem qualquer culpa.
Estranho, ou talvez não, o facto de a classe política mais “tradicional” ter comentado as conclusões da iniciativa como “velhas ideias”. Na realidade, “velha ideia” parece ser esta de um político profissional comentar negativamente as propostas de um profissional não-político. Queira então o estimado leitor fazer o seu próprio juízo, tendo em conta as principais conclusões/orientações de cada um dos sete desígnios: valores, pessoas, organização, territorialidade (espaço), recursos, conhecimento e cultura.
Da minha parte, e pese embora a minha parcialidade decorrente do facto de integrar o “Novo Portugal - Opções de uma Geração”, não me parece realmente tão pouco inovador um documento de propostas tão sistematizado e abrangente como o então produzido.

- Criar um modelo de administração baseado em regiões, estimulando o conceito de cidades-distintivas e o reforço das especificidades da Grande Lisboa e do Grande Porto;
- Departidarizar a Administração Pública, rever o modelo eleitoral no sentido de aumentar a responsabilidade dos eleitos face aos eleitores e reforçar as competências autárquicas;
- Estimular o princípio da subsidiariedade, tornando tão próximas e simplificadas quanto possível as decisões relativas a cada cidadão no plano administrativo, judicial, fiscal, da saúde e da educação;
- Potenciar activamente a investigação e desenvolvimento, a taxa de literacia, a natalidade, a mobilidade, a imigração criteriosa e a retenção de activos e investigadores altamente qualificados, através da adopção de políticas de investimento específicas;
- Substituir o modelo de ensino baseado na repetição pela máxima da paixão criativa, e desenvolvendo os conceitos de empreendedorismo, responsabilidade individual e social;
- Alargar a área da concertação social a universidades, grandes empresas, start-up’s e outros organismos sociais, e promover o estabelecimento de protocolos banca/universidade/novas empresas para fomento da iniciativa empresarial e do empreendedorismo;
- Promover o diálogo inter-geracional e inter-cultural, de forma a recuperar e consolidar a memória colectiva e histórica e, em concreto, apostando no turismo cultural e na exploração do factor língua como factor de competitividade;

Serão estes ou outros sete desígnios capazes de, um dia, abrirem as portas da discussão profícua e apartidária no nosso País?

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